As políticas nacionais de educação em Portugal

Nos regimes autoritários, a preservação da ideologia dominante e a construção de uma identidade nacional alinhada ao poder político constituem práticas recorrentes e estrategicamente indispensáveis. Nesse contexto, os meios de comunicação social e os dispositivos institucionais de socialização assumem um papel central na difusão de uma identidade nacional que, conforme sublinha Pereira, deve ser compreendida como um “fenómeno cultural coletivo” (Pereira, M. P., 2014, p. 61). Entre esses dispositivos, a escola destaca-se como um instrumento privilegiado do Estado, funcionando simultaneamente como espaço de instrução formal e de inculcação ideológica, cuja relevância se intensifica à medida que se amplia a escolarização da população infantil.

Contrariamente a uma perceção amplamente difundida, o combate ao analfabetismo não é, em si, incompatível com regimes autoritários. Pelo contrário, pode servir os seus interesses, desde que o sistema educativo esteja ideologicamente orientado e subordinado aos objetivos políticos do regime. A alfabetização, neste quadro, não se configura como um meio de emancipação crítica, mas como um mecanismo de integração social e de reprodução da ordem política vigente.

No caso português, durante o Estado Novo, esta instrumentalização da educação desenvolve-se num contexto marcado por fatores históricos específicos. Desde logo, a herança de um sistema educativo estruturalmente frágil, resultante de séculos de atraso na generalização do ensino básico, refletia-se em elevados índices de analfabetismo que persistiam nas primeiras décadas do século XX. Apesar das reformas educativas ensaiadas durante a Primeira República, revelaram-se insuficientes para alterar significativamente o panorama educativo nacional.

Assim, na primeira década do Estado Novo, conjugam-se dois elementos fundamentais que favorecem os objetivos políticos de Salazar. Por um lado, a existência de uma população majoritariamente analfabeta, cuja progressiva integração ao sistema escolar permitia ao regime moldar precocemente valores, comportamentos e representações sociais. Por outro, os dados dos recenseamentos nacionais indicavam uma ligeira, mas consistente, redução do analfabetismo, sinalizando um campo fértil para a expansão de uma escola primária fortemente centralizada, moralizadora e ideologicamente controlada. Neste sentido, a educação assume-se como um pilar estruturante do projeto político do Estado Novo, articulando a instrução elementar, a disciplina social e a legitimação do regime.